domingo, 28 de agosto de 2016

A Tragicomédia Antropocósmica da América-portuguesa

Quando. Deus,
afetou de amor e praga o tempo espaço 
imediatamente fez-se verbo em performance
luz, água, gás,
terra em revolução. 
O fogo cênico 
é meu signo mór.


A humanidade não sou eu.

Agora sou professor em uma escola pública. Caos e choros. Tenho quarenta constelações para ordenar, ordem e progresso, vinte e sete estados da minha matéria. Agrotoxinas. Não se sabe nada dos inícios nem dos finais dos ciclos. Subentender a circularidade dos acontecimentos por obviedade entre as alternativas. Respeitar o corpo do outro, meu corpo. Meu corpo, minha vocação pastoril me sustenta, pensamento didático e cativo. Aos poucos te introduzo uma visão incontestável, uma luminosidade impossível. Vacinação preventiva. Um espetáculo stanislavskiano para indígenas crédulos. Cegueira parda. Primeiro segundo. Do início era gêmeos, univitelino. Era uma vez dois, mas era um só. Contestar este absoluto porquê. Arquear argumentações superativistas sobre mim, tréplica da justiça dos burgos, dívida pública sobre o financiamento vocabular e fonético da linguística lusófona. Fundamento ptérico da constituição jurídica, amebótica e econômica desta terra, brasil. Saramago.

Trabalhar com elementos de conexão das ideias literárias. Encontro meu deus na curva e não esquinas. Estou de giz em uma tábua verde musgo, eu sou a morte platônica, um anti-museu, tratados de subsistência das gerações do passado recente. Concubinos da (in)disciplina de pré-vestibular para graduação pós-morte. Utilitarismo arquitetônico dominante, esquadrias de alumínio e vidro, marquise, portas rolantes e escadas giratórias. Armarinho de materiais escolavonistas. Scientia, vitta et fome. Um milhão de celulares em uma sala de aula. Fila indiana quilométrica para o inseguro emprego, previdência social democrata burguesota. PSDB. O governador rouba merenda de creches rurais e de periferia asfáltica, com televisão a cores, noticiário de tendências da moda neoliberal. Ópera de sopas. Manipulação de bonecos multimidiáticos no teatro de revista. Acadêmia de mestres bonequeiros e marionetes pós-foucaultianas. Luva. Antropometria e reprodução assexuada de sombras. Jornalismo marqueteiro de formas desanimadas. Eu vou acabar com essa novela mexicana.

Construí uma fortaleza de livros didáticos descartados. Venda proibida. Minha alma está no topo da torre mais alta. A prova. Biblioteconomia marxista. Empoderamento de jovens escritores, ler mulheres da literatura nacional, dormir e não sonhar, de olhos abertos com um beste célere autografado pelo primeiro homem transsexual da acadêmia brasileira de números circenses. São Paulo. Sob a tutela estatal estão tais seres sem alguma iluminação pirotécnica, animalidade humana pura, pagã, putas sem escrúpulos nem estribeiras, classe dominada de semianalfabetos políticos. Estadão. Quero chegar na urna eleitoral em dia de plebiscito e teclar a sequência fibonacci milagrosa, solucionará toda a indagação que sinto, vou exprimir em meu voto tudo que está incomunicável no meu vocabulário. Programa de manutenção e subsídio de representações políticas do gênero homem branco cis heterossexual rico com mais de cinquenta milhões de anos pela família ponto com. Deus. Marcha satírica dos indivíduos vivos pela desigualdade natural. Fundamentalismo hermético parlamentar. A restauração e conservação ininterrupta da arquitetura moral violenta e de exploração.

Eu que sabia falar até, oralidade
Só consigo escrever: não
Para interpretar.

A literatura brasileira é um embrião, germe, o futuro distante, transposição tântrica das paredes pré-fabricadas, inconstitucional, experimentação morfossintática, drama, improbidade moral da porca língua orto do porto morto. A literatura brasileira não será em língua portuguesa. Uma colonia de zangões, sem mãe, nem rainha. Ovos de páscoa cozidos no calor da terra. Ninho de pedra e mato. Nossa condição lógica aborígene, de má educação, sem modos, nem cômoda de mogno. Vinho e queijos. O moinho é um mundo. Aberração construtiva funcional. Silo de grãos e dor. Uma nação de descendentes do Sancho Pança. Relojoaria. Lavar das lavouras e plantações todo o fertilizante, riqueza acumulada e podre, galpões teatrais de reserva de comicidade, fermentação do trigo, do leite e do arroz. Máscaras larvárias. Comida devagar, sirva-se você mesmo, mula. Pratos típicos de mosteiros e monastérios. A palavra. Conservatório de musicistas revolucionárias. Mercadores mecenas mercenários messiânicos de Veneza. Dom Quixote de la macha de sangue. O homem de lata. O homem de frasco de vidro de azeitona. O homem de plástico embalado a vaco. O homem de caixa de papel tetra parque vencido. Cabelos de anjo e chocolate. A mãe canceriana violentada pelo pai de áries, o fim da palmatória, acabou tudo, atolou, o pau. O homem do século vinte e um. Miguel de Conservantes. O homem desconstruído.

Eu, balaio, cesta de vime, saco de batata baroa, palhoça, estopa de pano. 

A escola tradicional é um feudo. Pátio. Colegiados arados de ideologia, nota zero, júri, jogos de azar e juros, correr todos os últimos momentos do recreio, via campesina de concentração da disciplina, como se não houvesse o amanhã de manhã. Sentinela e vigília, cofre franco-suíço com moedas de ouro guardadas por duendes deformados, coordenação real, ordenação motora, do sangue azul. A nau, castiçais e vela velha, anais de publicação de cunho proibicionista e inquisitório, ferraduras cirúrgicas do mal, exposição de objetos de tortura medieval. Livro negro, navio negreiro. Ajoelhado no milho com chapéu de burro. Brincadeiras de cirandinha, amarelinha e pião. Mimeógrafo. O mal humor cômico dos meus personagens trágicos de noção pré-renascentista em dramaturgia contemporânea catarinense, este texto, experimentus laboratorial de uma bibliografia católica coibida outrora. Interpretar uma representação cênica fêmea com falo por liberdade. Estou grávido de mim mesmo, com vontade de comer você, meu rei, as glândulas mamárias lactando, árvore de leite e manga madura, doce caseiro do pé de jabuticaba, bicho, a serpente larvária corroê o fruto proibido dos jardins pictóricos naturalistas rococó. Renda de bilros em trabalho de parto, alegria, dor, lágrimas e grito. Doulas angelicais deslaçando meu cordão umbilical aos dos meus filhotes onívoros, oviparidade. Cor de pele. Eu, miscigenado sapiens amerindígena hispano-luso-ibérico e outras poesias sapiens.

O poder discursar ao latim, 
herança genética em euro, 
na pirâmide estou no centro, ser do clero. 
Augusto dos anjos. 
Teatro jesuíta quinhentista, palco italiano, catequese,
 ensinar didaticamente o medo das imagens infernais e diabólicas, escravocracia docente proparoxítona. 
Beijar um ilustríssimo dicionário de línguas mortas e prometer castidade.

Lápis lazúli, 
cativo amor recíproco no cativeiro, baú de iguarias, incensos e temperos exóticos, ouro inca, cristal líquido, cartografia de missão e o mapa ilustrado do tesouro perdido do senhor, 
o destino.

Ministério da saúde, sabedoria e solidão. Próspero. Uma monarquia absoluta divina individual, rainha da escola fundamental de samba enredo. Piada de macho semi anal alfabeto, gafe na gafieira, brasileiro nasce driblando normas ortográficas portuguesas, subsistência à polícia e a ditadura empresario-militar que não existe para velhos pálidos injustos, todos os senadores e a suma dos deputados, o horror da libertinagem na assembléia sem deus, uma brasília amarela e verde imatura. Edital de ilicitação. O mitologista no desemprego, contador de história contábil por vocação, alfândega, salafrário, falange de milícia, afago, fagocitose. O triste é um professor quando não é amado, todo retrocesso não tem respeito, o grande vendedor é a desgraça, finca bandeira clandestina no olho do território sagrado, de graça, colhe flores diagonais pelo nariz, rosa do mal, do vento, sente o baixo ventre vibrar, profano o último osso sacro, isto é plágio, penetrei a vertigem. Conquista e colonização dos a lunos com tecnologia luminosa lunar. Astrolábio astrológico de lógica astronáutica.

Engoli os sapos, obedeci os ratos, papagaios de pirata comandados por tucanos burocratas, encomendador, merco, gleba sul, patrimônio e matrimônio. Os anos do exílio político, as paredes aprenderam a contar os dias, o sol moldurado pela janela, entrecortado pelas grades de minério, soldado, explorado, maquinário de medo maciço, fera mamífera mortífera, massa de manobra cabralina e colombina, mal tratado de Tordesilhas, arlequino em delicadeza e brio nos limites do desastre mercantilista de quinhentos, diplomata farsesco e invejoso por excelência. Deus concedeu asas às cobras por decreto real, o mundo que era monodimensional virou a rede globo, o chorume eurocêntrico fluiu pelas correntes oceânicas. A mar, esgoto a céu aberto e terra à vista ou parcelada. Por temporada pago, meu aluguel com aulas obrigatórias. Obrigado.

Circo e pão. O primeiro papa latino-americano será franciscano, a coerência moral que o rima verbal. Então chamará toda a Argentina chorando por mim, seus olhos doídos das cebolas que brotam do recorte das camadas sociais, meus sentimentos, a revolução dos bichos oprimidos e dos nichos de trabalhadores. Feijão tropeiro, arroz, doce deleite. Os parâmetros curriculares nacionais incluíram a arte como matéria disciplinar importantíssima. Amém. Canto orfeônico e bachianas brasileiras, um estádio de futebol feminino em construção, releitura trágica da sétima feira de ciências, todos os homens a uma oitava série abaixo, finita e além. Neste país o que é lástima, é hilário, todavia, não se pode chorar, nem rir. Ensinar para aprender, fingir saber para não provar, reprovar para não proceder, ceder para continuar. O nascimento é um erro e não se pode errar duas vezes. Eu sou uma anta. 

Os para atletas olímpicos fugiram a nado das costas gregas rumo ao Rio. Final mente. De janeiro a dezembro acontecem as disputas pelas medalhas de osso, pele e carne. O paraíso dos europeus em crise é uma terra tropical emergente e cativa, onde se pula carnavais para esquecer as dívidas externas impagáveis. Convidamos todos os olhos do mundo para verem a mais estúpida das nossas derrotas, abrir as pernas, jogar na cara cada mazela indigerida maquiada em photoshop, ter pré conceito, cloaca, deglutição, antropofagismo reverso, falar das fragilidades e das favelas, ocluir.

Eu nasci para ser professor, absolutamente.
Vou ensinar as pessoas a ensinar outras pessoas, acabar com o meu próprio ofício, suicidar-me de carteira escolar assinada, prematuro, aposentar com uma pensão magra esturricada, raquítica, dolosa, docente. Estudar as teorias por esporte, completar palavras cruzadas impossíveis, passar no vestibular de medicina literária aiurvédica e antroposófica, receitar uma farmacêutica gramatical e semântica utópica, dominar com relaxamento e consciência as ações da língua materna.

Agora abro espaço mental no saguão do seu crânio para um rito de profanação dessas paredes normais da língua culta e coesa, tome licença para amaldiçoar todos os que foram de má fé, reivindica, exclama, roda a baiana e desce o santo do salto. Use os instrumentos de tortura militar para libertar os ladrões e os policiais, os cidadãos, incendiar de discurso lúdico a luta antimanicomial, pegar estas palavras e da-lhe tapa de luva, comer os juros e pagar na mesma moeda, condicionar o assoalho pélvico fêmeo a atacar e o egocentro másculo a render, descongelar-se, ser omoplata e fêmur. Vênus em capricórnio, lua minguante em virgem. Moral da história a flor da pele.

Tudo o que escrevo é biografia minha. Auto da fé, meu nordeste. Com paixão e misericórdia. Revisão crítica criativa criacionista, psicanálise do discurso hegemônico dentre os nossos e a criação do meu filho, valentina valente. Deus fala fluente comigo pela sequência simbólica dos acontecimentos rotineiros, cena e claquete, oração de redenção bondosa das tradições opressoras de ensino, luz, câmara e ação. O final desta epopeia está sendo escrito agora, observe, obstante. Ao final do discurso poético militante, saia da sala de exibição, abandone o teatro só, caminhe até o seu lar e pense como sempre, reflita como espelho, mostre aos outros esta imagem, o enigma cotidiano. Chore e faça rir. Escrever para poder falar um dia, que, o que se desgasta fácil e aceite, é a pedra mais valiosa de todos os tempos. Óvni óbvio, no celeste, no celeiro. Eu sou o aluno, iluminação pública, que aprendeu sozinho a ser professor de si mesmo. Peitar e respeitar.

Agora não vou dizer mais nada. É o fim do felizes para sempre. Amem.

O fruto amargo ou A ilha do sonho. Gilvan Samico

Um comentário:

  1. Se não és humanidade, és universo?

    Fiquei pensando em como poderia descrever o seu texto e as sensações diversas que ele causa em mim. É uma tarefa árdua, e não sei se necessária. O que consigo constatar é que o seu texto é um labirinto. Os temas e questões expostas nesse texto estão espalhadas por ele. Eu caminho por corredores diferentes, e revejo determinados assuntos em lugares novos. Os assuntos retornam no texto. As palavras solitárias estão naqueles corredores estreitos e sem saída. Fico parado de frente pra elas. “Mimeógrafo.” Enquanto os versos aparecem em paredes semelhantes, sem saída, mas em galerias espaçosas. Nesse labirinto, o fio de Ariadne é cortado por agentes do texto, e isso torna impossível revisitar esse labirinto com o mesmo caminho. Cada vez que li o texto novos pensamentos e imagens surgiram na minha cabeça. Nunca voltamos ao texto da mesma maneira, e nesse seu texto isso é muito mais potente do que o normal. Nosso corpo também é um labirinto. Essa analogia do labirinto com o seu texto mostra o quão instigante ele é. Mostra a variação da velocidade dele. O tempo também muda nesse labirinto. Cheio de curvas e esquinas, e quem leu imagina onde estará deus e as outras figuras que são mencionadas no mesmo.

    A transposição do universo teatral pra sua escrita expande o plano sensorial. Você faz emergir uma série de imagens muito poderosas, e também memórias físicas muito potentes. Acredito que está no alcance de quem não tem tanto contato com teatro. Talvez a partir daí você contribua com o léxico metafórico de quem lê. Você me faz perguntar o que seria a nossa língua e nossa literatura. Penso que talvez possa ser algo que toca. Algo que se sente. Algo palpável e material, que nem tu propõe aqui. Permito-me viajar na sua proposta: E se pra entender uma língua a gente tivesse que entender as coisas com o corpo? Se o léxico incluísse gestualidades? Não sei. Fiquei imaginando aqui. Se tivesse que fazer teatro pra saber alfabetizar? Dizem que nós brasileiros somos tão táteis...

    Eu ouço múltiplas personas desse autor dialogando comigo. São personas que você pode representar, sim!, por suas vivências, pelo que posso analisar. Uma pessoa mostrando a expansão que se dá nas ramificações criadas do microcosmo pro macrocosmo, e vise versa. Questões políticas! Questões da língua, da escola, da arte...

    É muito interessante a sua relação com o ofício de ser professor. Como ela não é egoísta. Ela até se sacrifica. Eu já ouvi professores dizendo que o aluno deve destruir o seu mestre. Deve superá-lo! Bom, acredito que quem ensina pode deixar chaves pelo caminho de um aprendiz para que esse (a)luno possa alcançar esse novo limite. Acho isso interessante, pois faz as coisas ficarem em movimento. Nunca chegaremos no fim. Nunca saberemos de tudo. Alguém continuará esse percurso.

    Acho que estou me estendendo muito no que era pra ser um comentário. Há tanto pra dizer, pensar e perguntar. Sobre a escola! Sobre o significado dessas gestações e dualidades. Sobre o homem de frasco de vidro de azeitona. Há tantas coincidências aí! Tantas referências ilustres. Tanta biografia escancarada. É o seu labirinto, que será revisitado muitas vezes. Onde ninguém pode errar duas vezes, pois não tem como chegar no mesmo lugar duas vezes.

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